De toda a extensa obra de Beatrix Potter, de quem sou fã, sinto que nenhuma me agrada tanto quanto A história dos dois ratinhos travessos. É um livro que reúne todas as melhores características dessa grande autora inglesa: senso de humor afiado, dois anti-heróis rebeldes e um pequeno mundo em miniatura.
Eu sempre achei que A história de Pedro Coelho era uma defesa da transgressão mal disfarçada de conto moral (cautionary tale), essa forma narrativa típica do período vitoriano. Claro, Beatrix pune a ação de Pedro ao final, mas de maneira tão leve que o leitor não tem escolha a não ser ficar do lado do coelhinho.
Neste livro, a transgressão dos dois ratinhos do título é ainda mais interessante. Tim Mindinho e Unca Munca, um casal de ratos parceiros no crime, invadem sorrateiramente uma casa de bonecas. Surpresos ao descobrirem que a comida não era de verdade, quebram tudo, à maneira de verdadeiros rock stars e ainda roubam metade da mobília. Surpreendentemente, não são punidos ao final e Unca Munca pode dormir tranquila em nova sua almofada de penas.
Para além da cena icônica de dois ratinhos depredando uma casa vitoriana em miniatura, cena tão significativa quando se sabe o quanto a autora sofria com as rígidas estruturas sociais da época, eu fico encantada com a camaradagem deste casal de ratos. Eles agem em sintonia tão perfeita que me pego pensando na felicidade que Potter sentia na época em que escreveu o livro. Ela estava noiva de seu editor, Norman Warne, a contragosto da família, que achava aquele casamento indigno e insuficiente. Ainda que essa parceria tenha sido breve e tenha tido um fim um pouco trágico, a de Tim Mindinho e Unca Munca é eterna.
Espero que os leitores possam fazer suas pequenas transgressões com sucesso, pagando-as, talvez, com uma moedinha amassada ou pequenos favores.
(Janaina Tokitaka)
(Edições Barbatana)